quarta-feira, 30 de maio de 2012

\ \\ Ícones // /

Remeto a um dos parágrafos que citei anteriormente: a opinião de Tibor Kalman de que a palavra "cool" estava a substituir a palavra "conteúdo"[1]. Que quer isto dizer no contexto da arquitectura? Quando vemos edifícios que se manifestam por serem bastante diferentes dos que estamos habituados a ver, o que estão eles a querer comunicar? Terão uma razão perfeitamente justificável no que concerne à forma que decidiram tomar ou é este apenas um "Look at me!", o querer tornar-se ícone, marcando pela diferença aliando-se ao factor "cool" e ignorando todos os outros aspectos.

I am suspicious of architecture which makes pompous claims for itself. I think a design that sets out with the conscious intention of being Iconic is unworthy. And, I think a pre-requisite of a good design is one which contributes to its context. [2]

Há bons ícones e maus ícones, para que um ícone seja válido precisa de contribuir para o contexto urbano. A ausência de ícones pode tornar uma cidade "enfadonha" e sem pontos de interesse, mas demasiados ícones confundem-nos e já não sabemos a qual devemos dar a devida apreciação. Graham Morrison descreve a criação de um ícone através da analogia das provas de mergulho, cada participante tem pontos conforme a dificuldade do seu salto, e deve entrar na água de forma graciosa e com o mínimo "splash" possível, mas para muitos designers e arquitectos, entrar na água sem espirrar água para todos os lados não faz parte dos seus planos.

Descriptions of the dives like ‘A flying forward double somersault with twist’ bring the images of several recent buildings to mind. Add a ‘reverse take off with jack-knife’ and you will have a spectacle that will simultaneously confuse the critics, impress the students, and momentarily delights the public. [3]

A Igreja Caravela pretende sem dúvida ser um salto com este tipo de nome, confundindo toda a gente que passa ao mesmo tempo que os faz parar e contemplar o edifício por nunca terem visto algo semelhante.

Morrison propõe uma série de questões que devemos pôr para criar uma opinião perante edifícios deste tipo:

1. Dentro da ordem e equilibrio da cidade, será de valor representar uma certa coisa como ícone?
2. Porque é que tem este aspecto?
3. Estará a esforçar-se demais?
4. Que contribuição tem este ícone para o seu contexto [4]

Põe-se também a questão se não estará a acontecer algum tipo de "efeito Gaudi". Edifício que geram muita polémica negativa nos primeiros tempos em que são construídos mas que depois são aceites até se tornarem eventualmente num motivo de orgulho. Estará esta igreja apenas fora do seu tempo?

Although we live in a secular age, we still need familiar and reassuring reference points. With traditional Icons, such as temples or churches, no longer holding the same significance, we need to replace them with new forms which confirm the change in our values, continue to make our evolving cities more legible, and to give us pleasure.

Vivemos numa era secular mas que ainda não perdeu a sua espiritualidade. Não é necessário ser-se religioso para se apreciar uma igreja ou para se retirar prazer do silêncio e da actividade meditativa, muitos não se identificam com a doutrina mas continuam a querer participar nestes rituais à sua maneira, e esses rituais têm de facto algo para dar [5]. As igrejas modernas têm também de pensar nestas pessoas e como as poderão cativar, de um certo modo, porque dependem delas para a sua continuação e não perderem a sua função por completo. Isto é retratado pelas (cada vez mais) igrejas abandonadas pela ausência de frequentadores, como a Reading Between the Lines, reaproveitada mais tarde através desta iniciativa. Neste intuito uma certa alteração formal dá um carácter mais neutro e apelativo às estruturas, conferindo-lhes um estatuto de ícone que mergulha suavemente sem qualquer salpico, chamando pessoas a uma zona esquecida. Estes são os bons ícones.

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[1] KALMAN, Tibor - Social Responsability (Entrevista por Steven Heller), 1998.
[2] 
MORRISON, Graham - The Trouble With Icons, Speech to the AJ/Bovis "Awards for Architecture" dinner, 2004.
[3] Idem
[4] Idem
[5] BOTTON, Alain de - Atheism 2.0

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